Herói, Vilão, Luva, Olho e Óculos

Tantas facilidades na vida e acabo pecando no meu maior pecado: amor. Fantasiando ideais e relembrando os anos 40 por toda a tarde, de mãos trêmulas, segurando uma caneca sem cabo cheia de café.
Um dia meu maior herói me destruiu como se eu fosse o seu maior inimigo, o vilão, e a pancada no peito foi inacreditavelmente irreversível. Doces lembranças dos meus seis. Doces seriam se não me tivesse roubado os doces.
Ficou o amargo no coração da Mulher Maravilha, com seu escudo remendado e com seus super poderes redirecionados. Ficou amargo também o peito do vilão, que cheio de amor, se encheu de dor e perdeu a cor.
Desde  então, o amigo do herói viveu cinza e sem a capacidade de sentir as coisas de verdade. Vazio, talvez. Devia ser por isso que estava sempre faminto.
Não conseguia se apegar a ninguém. Não conseguia usar o coração sem se drenar e ficar a vácuo dentro de seu próprio peito. Nada mais sentia. Nem pelo herói, não tinha amor e nem aquele ódio que dói.
Um dia um novo herói apareceu, nada este tinha a ver com aquele. Aquele era seu pai e este seu par. Par este que serviu como uma luva para uma  mão. Mas as mãos do ex-amigo-do-herói-agora-vilão eram incomuns e difícil de se encaixar nas luvas. A luva servia, mas não de maneira inteiramente confortável. Muita coisa ainda tinha que mudar. O vilão, agora mão, tinha que aprender a se agarrar com os dedos e não soltar.
Foi então que depois de muitas tentativas, a luva finalmente entrou e o vilão pode sentir seus dedos aquecidos pela primeira vez na vida, até que esqueceu completamente do seu herói.
Com medo do que estava por vir, segurou firme até que seus dedos  ficassem dormentes. E se ele relaxasse os dedos e a luva o deixasse? E se a luva se chatear? Estava a mão segurando forte o suficiente? A dúvida era cruel e matava a luva por dentro, mas ela usou todas as suas forças pra ficar ali, agarradinha.
Com tanto esforço para se manter sempre agarrado sem descanso, começou a se sentir mal e desconfortável. Mas ainda segurava. A luva o aquecia, o fazia bem, mas parecia não reconhecer os dedos que estavam roxos de força. A mão, exausta, tentava relaxar os dedos um pouco, mas não podia, pois a luva era muito exigente.
A força da mão, que era tão grande, foi sugada para dentro de si, onde se escondeu, fazendo com que ela afrouxasse os dedos até que se soltasse, e ficasse imóvel.
A mão amava a luva e amava se sentir aquecido por ela, mas ela não podia mais mexer seus dedos, pois estavam exaustos e cheios de calos.
A mão agora sem dedos se tornou um olho, que não se agarra e nem aperta, apenas observa. A luva se tornou um óculos.
O olho não não tinha mais lágrima, pois também secou. O óculos não tinha mais olho para ajudar a ver e proteger.
Agora o olho não enxergava mais nada, pois sua vida voltou a ficar acinzentada... Começou a lembrar do herói. O herói que estragou seu interior.
O óculos estava desolado, pois entendeu que precisava deixar o olho de lado.
Olho esse que fechou-se, pois se esgotou por ter chorado.

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