Muda de flor e muda de dor

Minha existência nesse lar é tão despercebida quanto aquele gato, que pulou a janela pela terceira vez consecutiva. Uma monotonia que é quebrada somente quando os trovões vociferam, e escondem o barulho do medo que atordoa os ouvidos. As vozes são altas, mas os trovões são mais. Se pelo menos eu falasse a língua das nuvens, teria com quem conversar.

Com a falha como maior medo, e eu como arqui-inimigo, cambaleio insensatamente pelos cantos à procura de palavras que façam-me encontrar sentido, talvez sentindo, e talvez consentindo de que os novos planos são certos.

A solidão está tão presente que, se embrulhar no natal, fica mais óbvia que aquela bola debaixo da árvore enfeitada de luzes. Luzes estas que nem piscam mais. Mas tentar é a chave da libertação, mas nesse caminho todo, a solidão quer dar a mão.

Para atravessar a rua, somente com ela, e para chegar do outro lado, não existe passarela. Um dos maiores desafios da vida de alguém é a transição para a vida adulta; basicamente ser forçado - deliberadamente - a conviver com as responsabilidades da vida real.

Não sinto-me preparado para ficar parado, e talvez eu precise de ajuda para andar... Mas como pedir ajuda, se vivo sem par? Par não é aquele que te leva pro altar, mas sim alguém de verdade, que mostre vontade, pra te mostrar que existe oportunidade.

Mas naquele mar de concreto, repleto de gente, onde eu sendo mais, passo mais por indigente. Quieto num canto, sem poder recorrer, mais claramente com medo de morrer.

Sou escasso dentro do meu próprio lar. 

Sinto-me desconectado de quem um dia me manteve perto por um cordão umbilical. Gera tristeza e revolta. Parece até que não consigo lidar com o que está em minha volta. 

Talvez uma injeção de ânimos me ajudasse a crescer, mas quem menos acredita em mim, é quem deveria me fortalecer. Aprendi então que, infelizmente, não se busca apoio nos outros, porque estão ocupados demais se preocupando com os bolsos. 

Também me preocupo com o meu, mas ele está tão vazio que parece que morreu. Se existir uma chance, talvez eu a alcance, mas até lá, espero que pelo menos a paz eu possa encontrar.