Água mata sede de água
Estou parado dentro de uma sala sem janelas, escura, úmida e quente. Seu cheiro infesta minhas narinas que, apesar de respirarem mal, o sentem. A umidade me ensopa de suor. Talvez - penso devagar - se abrissem uma janela em um dos cantos eu ainda permaneceria deitado, em letargia, levantar demanda muito de mim, permanecer de pé exige o dobro de mim e escalar exige tudo o que eu não tenho. Permanecer deitado me mantém - ou melhor - não me gasta. É como se deitado eu economizasse a vida que me deram e envelhecesse mais devagar.
A iluminação é artificial, às vezes fria, às vezes quente, imita noite, imita dia, imita gente. Viro-me no chão e procuro a segunda posição que mais me agrada. Coloco o braço esquerdo por sobre o rosto, cobrindo os meus olhos - e nessa sombra eu adormeço, esperançoso pela próxima (e cósmica) parada.
Sem saber que sonho, olho para os lados e vejo um bosque denso com pequenas frestas no topo entre as folhas de suas árvores. Os passos soam mofados no solo de terra e grama. Respiro fundo com narinas desobstruídas e a cada passo, poeiras tímidas circulam pelas frestas de luz. "Olhos azuis" - falo em voz alta e percebo minha própria voz. Ela soa diferente de quando existe apenas dentro da minha cabeça. "Tem uma senhora na luz". Deve ser a dona do bosque, penso. E ela me observava entre as frestas de luz que rasgavam o escuro gostoso do bosque. Respiro fundo e solto pela boca. É como matar a sede, de certa forma.
"Água mata a sede de água, ar mata a sede de ar, e o que mata a sede do que eu sinto por dentro?" me percebo sussurrar com a voz da boca, que é diferente da voz da cabeça, e que não é mais em itálico. Estou acordado. Sinto sede.
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